Crônicas

O rei está morto

Por Evandro Ferreira, que se tornou santista ainda pequenininho, numa época em que o Santos não encantava porque seu tio lhe contava histórias de um time ideal, com Pelé e outros craques.

 

No ano da consagração da carreira de Lionel Messi, pelo tricampeonato da Argentina, eu pensei que nada pudesse ser mais marcante para o mundo do futebol, mas, aí, Pelé se foi.
Ora, havia algum tempo que fingíamos nos preparar para essa notícia, afinal de contas, Pelé, ainda que insistíssemos em vê-lo como o garoto que encantou a todos aos 17 anos ou como rei coroado diante do mundo aos 29, era, na verdade, um senhor, envelhecido pelo peso 82 anos, que denotavam uma condição de mortalidade que nos recusávamos a aceitar.
Mortalidade?! Pelé é imortal. Pelé é eterno. Sim! Ele é. Acho que é improvável que alguém consiga listar tudo que ele inovou no futebol.
Quantos dribles ele lançou? Quantos ele aprimorou? Quantos jeitos diferentes de fazer gol ele fez ou tentou fazer primeiro? Quantos movimentos ele inventou?
Se listar tudo o que ele fez de modo ativo é difícil, pensa só como é ainda mais complicado pensar no quanto o futebol se moldou à sua existência. Pelé em campo mudou o jogo do Santos e da Seleção Brasileira e de qualquer adversário que os enfrentasse.
Até os anos cinquenta, os times jogavam com três homens na defesa: dois laterais e um zagueiro. Para enfrentar Pelé, criaram o quarto-zagueiro.
Mas, olha, ele não foi o bastante, foi preciso recuar mais um homem do meio campo para a dar uma proteção extra à defesa. No Flamengo, esse homem foi o argentino Carlos Volante, e volante virou o nome do jogador que ocupasse essa posição em campo dali em diante.
E fora de campo: quem nunca escutou que Pelé parou uma guerra?
É bem verdade que essas histórias provavelmente não podem ser confirmadas e que algumas épocas nem batem com o relato, mas que outro personagem seria capaz de tornar verossímeis tais lendas?
Que outro esportista receberia a alcunha de rei? Pelé não tinha linhagem nobre – sequer tinha a cor adequada à sociedade de sua juventude –, mas foi escolhido pela bola, um objeto mágico, capaz de encantar milhões ainda hoje, tal qual Excalibur escolheu Arthur.
Quiséramos que essa coroa conservasse mais que a história, que os feitos, que os números, que as imagens, as lendas. Por nós, a imortalidade de Pelé iria além das ideias, salvaria homem, o manteria jovem, em campo.
Pelé partiu para sua ilha de Avalon e aqui será lembrado para todo o sempre, inclusive pelos gols que perdeu.
Obrigado, Vossa Majestade, o rei do futebol, por ter feito a vida nessa bola azul um pouquinho mais fácil! Vá em paz.

Ilustração: Evandro Ferreira

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2 comentários

  1. Vitor Hugo says:

    Texto Incrivel!! Emocionante! Descanse em Paz, Rei!

    1. Muito obrigado pelo comentário, Vitor!

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